Recorrer a Deus
Oxalá
todos os homens recorressem a Deus, quando são tentados a ofendê-lo; certamente
nenhum o ofenderia. Caem os coitados porque, impelidos pelos seus maus
instintos, preferem perder o supremo bem, que é Deus, só para não perderem uns
breves prazeres.
A
experiência mostra de sobra que quem recorre a Deus nas tentações, não cai;
quem não recorre, cai, especialmente nas tentações impuras. Salomão bem sabia
de usa impossibilidade de ser casto, se Deus não o ajudasse. Por isso recorria
a Deus nas tentações: “Consciente de que não posso ser continente, a não ser
por Dom de Deus, voltei-me para o Senhor e o invoquei do fundo do coração”
Sabedoria 8, 21.
Nessas
tentações impuras –e o mesmo acontece com as tentações contra a fé- não é boa
tática a gente se pôr a lutar com elas frente a frente, cara a cara. Quando elas
começam, é preciso procurar afastá-las indiretamente, fazendo um ato de amor a
Deus ou um ato de arrependimento dos pecados; ou então procurar uma ocupação
diferente que nos distraia. Logo que percebemos qualquer pensamento mau, é
preciso procurar livrar-se dele. Fechar-lhe, por assim dizer, a porta na cara e
negar-lhe a entrada na alma sem perguntar-lhe o que diz ou o que pretende. Essas
sugestões más devem ser apagadas logo como se faz com uma faísca que de repente
salta do fogo sobre nós.
A tentação começa nos sentidos
Se
a tentação impura já entrou na alma e mostrou o que desejava, provocando os
primeiros movimentos nos sentidos, deve-se fazer o que aconselha São Jerônimo: “Logo
que sentimos os movimentos da carne, comecemos a gritar: Senhor: sede o meu
auxilio”. Invoquemos os santíssimos nomes de Jesus e Maria que têm uma força
particular para dissipar essa espécie de tentações.
Diz
São Francisco de Sales que as crianças, vendo o lobo correm logo para os braços
do pai ou da mãe, pois ali se sentem seguras. Assim devemos fazer: recorrer
imediatamente a Jesus e a Maria.
Eu digo: ‘recorrer imediatamente’, sem
dar atenção a tentação nem discutir com ela.
Quais os meios que devemos usar para vencer
as tentações
Se
mesmo assim a tentação continua a nos molestar, cuidemos em não nos inquietar e
não nos irritar contra ela. De tal inquietação o demônio poderia aproveitar-se
para nos fazer cair.
Devemos
nos conformar com humildade a vontade de Deus que permite a tentação.
Devemos
rezar: “Senhor, mereço ser atormentado por esses pensamentos, como castigo
pelas ofensas que já vos fiz. Vós me socorrereis e me livrareis deles”.
Por
isso, se a tentação continua a perseguir-nos, continuemos a invocar os nomes de
Jesus e Maria. Enquanto a tentação persiste nos atormentando, convém renovar o
propósito feito a Deus de antes sofrer todas as dores e morrer do que
ofendê-lo; ao mesmo tempo não se deve deixar de lhe pedir ajuda. Se a tentação
é tão forte que nos vemos em grande perigo de consentir, é preciso redobrar o
fervor na oração, recorrer ao Santíssimo Sacramento, ajoelhar-se diante de um
crucifixo ou imagem de Nossa Senhora e rezar com ardor, gemer e chorar pedindo
ajuda.
É
verdade que Deus está pronto a ouvir a quem o invoca, sendo ele e não o nosso
empenho que nos dará forças para resistir. Contudo, as vezes o Senhor quer de
nós esse esforço e depois ele supre a nossa fraqueza, dando-nos a vitória.
É
bom também, na hora da tentação, fazer o sinal da cruz. É bom manifestar a
tentação ao diretor espiritual.
Dizia
São Felipe Neri que a tentação revelada já é vencida pela metade.
É
bom notar que é doutrina seguida comumente pelos teólogos, mesmo rigoristas,
que as pessoas que levaram durante muito tempo uma vida devota, tementes a Deus,
quando ficam em dúvida se consentiram em algum pecado grave, devem ficar
tranquilas de que não perderam a graça de Deus.
É
moralmente impossível que a vontade, confirmada por muito tempo nos bons
propósitos, mude num momento e consinta num pecado mortal, sem perceber
claramente. A razão disso é que o pecado mortal é um monstro tão horrível, que
não pode entrar numa alma que por longo tempo o detestou, sem se fazer
claramente conhecido.
Dizia
Santa Tereza: “Ninguém se perde sem saber, ninguém é enganado sem querer ser
enganado”.
Tentação consentida e tentação não
consentida
Para
algumas pessoas de consciência delicada e virtuosa, mas tímidas e molestadas
pelas tentações, especialmente contra a fé ou a castidade, será conveniente, as
vezes, que o diretor espiritual lhes proíba revelar ou falar dessas tentações.
Para
falar delas, terão de refletir como vieram aqueles pensamentos, se houve
prazer, complacência ou consentimento. Dessa forma, refletindo muito, esses
maus pensamentos causam maior impressão e mais inquietação.
Quando
o confessor está moralmente certo de que a pessoa não consentiu nesses
pensamentos, é melhor obriga-la a não falar delas. Assim fazia Santa Joana de
Chantal. Tendo ela passado muitos anos agitada por grandes tentações, sabendo
que não tinha consentido nelas, nunca se confessou disso, mas continuou
seguindo a orientação de seu diretor espiritual. Ela diz: “Nunca tive
conhecimento claro de ter consentido”. Dizendo isso, dá a entender que lhe
restava algum escrúpulo por causa daquelas tentações, mas se tranquilizava com
a obediência ao diretor que lhe proibia confessar tais dúvidas. No mais,
falando de modo geral, é muito bom manifestar as tentações ao confessor.
A Prática de amor a Jesus Cristo Cap XVII–
Santo Afonso Maria de Ligório
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