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quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Maria, Liberdade interior

Esta Devoção dá uma grande liberdade de espírito
§169. Sexto motivo. Esta prática de Devoção dá uma grande liberdade interior àqueles que a observam fielmente. 
- É a liberdade dos filhos de Deus (Gl 5, 1-13; 2 Cor 3, 17; Rm 8, 21)
- Como por esta Devoção nos tornamos escravos de Jesus Cristo, consagrando-nos totalmente a Ele nesta qualidade, este bom Mestre recompensa o cativeiro amoroso em que nos colocamos da seguinte maneira:
  • Tira da alma todo escrúpulo e temor servil, que só servem para a estreitá-la, escravizá-la e confundi-la;
  • Dilata o coração para uma santa confiança em Deus, fazendo-o ver n'Ele seu Pai;
  • Inspira-lhe um amor terno e filial.

§170. Sem me deter em provar esta verdade por meio de razões, contento-me em citar um fato histórico que li na vida da Madre Inês de Jesus. Era religiosa jacobina do convento de Langeac, em Auvergne, e faleceu nesse mesmo local em odor de santidade no ano de 1634. Ainda não tinha mais de sete anos quando já sofria de grandes penas do espírito. Foi então que ouviu uma voz dizer-lhe que, se desejava ser livre de todas as suas penas e protegida contra todos os seus inimigos, deveria tornar-se o mais depressa possível escrava de Jesus e de sua Santa Mãe.
- Mal regressou a casa, deu-se inteiramente como escrava a Jesus e à sua Santa Mãe, embora não conhecesse até aquela data esta Devoção. Tendo encontrado uma cadeia de ferro, cingiu-se com ela sobre os rins e usou-a até a morte. Depois desta ação cessaram todas as suas penas e escrúpulos.
- Ficou em tanta paz e liberdade de coração que ensinou esta prática a várias pessoas - que nela fizeram grandes progressos - entre outros ao Pe. M. Olier, fundador do Seminário de São Sulpício, e a outros sacerdotes e eclesiásticos do mesmo seminário. Um dia apareceu-lhe a Santíssima Virgem e pôs-lhe ao pescoço uma cadeia de ouro, testemunhando-lhe assim a alegria que sentia por ela se ter feito escrava sua e de seu Filho.
- S. Cecília, que acompanhava a Santíssima Virgem, disse-lhe:
Felizes os fiéis escravos da Rainha do Céu, porque gozarão a verdadeira liberdade: Ó Mãe, servir-Vos é a liberdade!

Esta Devoção causa grandes vantagens para o próximo
§171. Sétimo motivo. Outro motivo que nos pode comprometer a abraçar esta Devoção são os grandes bens que dela receberá nosso próximo. 
- Por esta prática exercemos a caridade para com ele duma maneira eminente, pois damos-lhe, pelas mãos de Maria, o que temos de mais caro, ou seja, o valor satisfatório e impetratório de todas as nossas boas obras, sem excluir o mínimo bom pensamento ou o mais leve sofrimento.
- Consentimos que todas as satisfações que adquirimos e havemos de adquirir até a morte sejam aplicadas, segundo a vontade da Santíssima Virgem, ou pela conversão dos pecadores, ou pela libertação das almas do Purgatório.
- Não será isto amar perfeitamente o nosso próximo? (Jo15, 13).
- Não é isto ser verdadeiro discípulo de Jesus Cristo, que se reconhece pela caridade? (Jo 13, 35).
- Não é este o meio de converter os pecadores sem perigo de vaidade, e de libertar as almas do Purgatório quase sem fazer mais nada além do que nos impõem os deveres de estado?

§172. Para se apreciar a excelência deste sétimo motivo seria preciso conhecer o bem que é a conversão dum pecador ou a libertação duma alma do Purgatório. 
É um bem infinito, maior do que criar o Céu e a Terra, pois é dar a uma alma a posse de Deus.
- Quando por esta prática se livrasse apenas uma alma do Purgatório, durante toda a vida, ou se convertesse apenas um pecador, não bastaria isso para levar todo homem verdadeiramente caridoso a abraçá-la?
- Mas é preciso notar que as nossas boas obras, passando pelas mãos de Maria, recebem um aumento de pureza e, por conseguinte, de mérito e de valor satisfatório e impetratório. 
- Tornam-se assim muito mais eficazes para aliviar as almas do Purgatório e converter os pecadores do que se não passassem pelas mãos virginais e generosas de Maria.
- O pouco que por Ela se dá, sem vontade própria e com uma caridade muito desinteressada, torna-se verdadeiramente poderoso para aplacar a cólera de Deus e atrair a sua misericórdia.
- Na hora da morte verificar-se-á que uma pessoa realmente fiel a esta prática, terá livrado, por este meio, muitas almas do Purgatório e convertido muitos pecadores, embora só tenha praticado as ações ordinárias do seu estado. Que alegria no momento do juízo! Que glória para a eternidade!
Quanto mais atenção dedicares a Maria nas tuas orações, ações, contemplações e sofrimentos, mais perfeitamente encontrarás Jesus Cristo, que está sempre com Ela.
Esta Devoção é um meio admirável de perseverança
§173. Oitavo motivo. Enfim, o que de certo modo nos impelirá mais fortemente ainda para esta Devoção à Santíssima Virgem é ser ela o meio admirável para perseverarmos na virtude e sermos fiéis.
  • Por que é que a maior parte das conversões dos pecadores não são duradouras?
  • Por que recaem eles tão facilmente no pecado?
  • Por que é que a maior parte dos justos, em vez de ir de virtude em virtude e de alcançar novas graças, perdem muitas vezes as poucas virtudes e graças que possuem?
- Esta desgraça provém, como já acima mostrei (nn.87-89), de que estando o homem tão corrompido, tão fraco e inconstante, se fia em si próprio, se apoia nas suas próprias forças e se julga capaz de guardar o tesouro das suas graças, virtudes e méritos.
- Por meio desta Devoção, confiamos à Santíssima Virgem -e sabemos como Ela é fiel- tudo o que possuímos.
- Tomamo-la como depositária universal de todos os nossos bens da natureza e da graça. Confiamo-nos à sua fidelidade, apoiamo-nos no seu poder e fundamo-nos na sua misericórdia e caridade, a fim de que conserve e aumente as nossas virtudes e méritos, apesar dos esforços que o demônio, o mundo e a carne fazem para nos roubar.
- Dizemos-lhe como um bom filho à sua mãe e um fiel servo à sua senhora:
“Guardai o meu depósito!” (1 Tm 6, 20).
- Minha boa Mãe e Senhora, reconheço que, por Vossa intercessão, recebi até hoje mais graças de Deus do que merecia. A minha triste experiência me ensina que trago este tesouro num vaso muito frágil, e que sou demasiado fraco e miserável para o conservar em mim:
“Sou novo e desprezado” (Sl 118, 141)
- Recebei, por favor, em depósito, tudo quanto possuo, e conservai-me por Vossa fidelidade e poder.
- Se me guardardes, nada perderei; se me sustentardes, não hei de cair; se me protegerdes, estarei ao abrigo dos meus inimigos.

Tratado da Verdadeira Devoção a Santíssima Virgem Maria / São Luis Maria Grignion de Monfort

Maria, caminho seguro

Esta Devoção conduz à união com Nosso Senhor
§152. Quinto motivo. Esta Devoção é um caminho fácil, curto, perfeito e seguro para chegar à união com Deus, na qual consiste a perfeição cristã.

Caminho Seguro
§159. Esta Devoção à Santíssima Virgem é um caminho seguro para ir a Jesus Cristo e alcançar a perfeição, unindo-nos a Ele.
1º. Porque esta prática de Devoção que ensino não é de modo algum nova. - Como afirma M. Boudon, falecido há pouco em odor de santidade, numa obra que escreveu sobre esta Devoção, ela é tão antiga que não se lhe pode marcar com precisão o início. É certo, no entanto, que há mais de 700 anos se encontram vestígios dela na Igreja.
- S. Odilão, abade de Cluny, que viveu cerca do ano de 1040, foi um dos primeiros a praticar publicamente esta Devoção na França, como se vê na sua vida.
- O Cardeal Pedro Damião refere que no ano de 1016 o bem-aventurado Marinho, seu irmão, se fez escravo da Santíssima Virgem, na presença do seu diretor e duma maneira muito edificante: pôs uma corda ao pescoço, tomou a disciplina, e colocou sobre o altar uma soma de prata, como sinal da sua dedicação e consagração à Santíssima Virgem. Manteve-se tão fiel a este ato durante toda a vida que mereceu, na hora da morte, ser visitado e consolado pela sua amável Soberana, e receber dos Seus lábios a promessa do paraíso, como recompensa dos seus serviços.
- Cesário Bolando faz menção dum ilustre cavaleiro, Valter de Birbak, parente próximo dos duques de Lovaina, que, por volta de 1300, fez esta consagração de si mesmo à Santíssima Virgem. 
- A mesma Devoção foi praticada por muitos particulares até o século XVII, em que se tornou pública.

§160. O Padre Simão de Roias, da Ordem da Trindade, também chamada da Redenção dos Cativos, pregador do rei Filipe III, pôs em voga esta Devoção em toda a Espanha e na Alemanha. Obteve de Gregório XV, a instâncias de Filipe III, grandes indulgências para todos aqueles que a praticassem.
- O Padre de Los Rios, da Ordem de Santo Agostinho, aplicou-se com o Padre de Roias, seu íntimo amigo, a difundir esta Devoção, por meio de seus escritos e pregações, na Espanha e na Alemanha. Compôs um grosso volume intitulado “Hierarchia Mariana”, em que trata, com tanta piedade e erudição, da antiguidade, excelência e solidez desta Devoção.

§161. No século passado, os Reverendos Padres Teatinos estabeleceram esta Devoção na Itália, na Sicília e na Sabóia.
- O Padre Estanislau Falácio, da Companhia de Jesus, promoveu maravilhosamente esta Devoção na Polônia.
- O Padre de Los Rios, no livro já citado, refere o nome dos príncipes, princesas, duques e cardeais, de vários reinos, que abraçaram esta Devoção.
- O Padre Cornélio a Lápide, tão louvável por sua piedade como por sua profunda ciência, foi encarregado, por diversos bispos e teólogos, de examinar esta Devoção. Depois de maduro exame teceu-lhe louvores dignos da sua piedade, no que foi seguido por muitas outras grandes personalidades.
- Os Reverendíssimos Padres Jesuítas, sempre zelosos no serviço da Santíssima Virgem, apresentaram ao duque Fernando de Baviera, então Arcebispo de Colônia, em nome dos congregacionistas da mesma cidade, um pequeno tratado sobre a dita Devoção. Aquele prelado deu-lhe a sua aprovação e a licença de o imprimir, e exortou todos os párocos e religiosos da sua diocese a propagar esta sólida Devoção, na medida das suas forças.

§162. O Cardeal de Bérulle, cuja memória é abençoada em toda a França, foi um dos mais zelosos em espalhar a mesma Devoção neste país, apesar de todas as calúnias e perseguições que lhe levantaram os críticos e os libertinos. Acusaram-no de inovação e de superstição. Escreveram e publicaram contra ele um folheto difamatório e serviram-se, (ou antes, fê-lo o demônio por intermédio deles), de mil estratagemas para o impedir de propagar esta Devoção na França. Mas este grande e santo homem respondeu às calúnias só com a sua paciência, e às objeções, contidas no referido libelo, com um pequeno escrito em que as refuta vigorosamente.
- Nesse escrito mostra como esta Devoção se funda no exemplo de Jesus Cristo, nas nossas obrigações para com Ele e nas promessas que fizemos no Batismo. 
- É particularmente com esta última razão que fecha a boca aos seus adversários. Faz-lhes ver que esta consagração à Santíssima Virgem e, por suas mãos, a Jesus Cristo, não é mais que a perfeita renovação das promessas do Batismo. Diz coisas muito belas sobre esta prática, como se poderá ver nas suas obras.

§163. O livro de M. Boudon, já citado (§159), refere os nomes dos diversos Papas que aprovaram esta Devoção, os teólogos que a examinaram, as perseguições que suportou e venceu, e os milhares de pessoas que a abraçaram, sem que jamais Papa algum a tenha condenado. Nem seria possível fazê-lo sem derrubar os próprios fundamentos do Cristianismo.
- Consta, pois, que esta Devoção não é nova. E se não é muito comum, é por ser preciosa demais para ser apreciada e praticada por todo o mundo.

§164. . Esta Devoção é um meio seguro para ir a Jesus Cristo, porque é próprio da Santíssima Virgem conduzir-nos com segurança a Ele, como é próprio de Jesus conduzir-nos seguramente ao Eterno Pai. E que os espirituais não caiam no erro de pensar que Maria seja um impedimento para chegar à união divina.
- Seria possível que Aquela que achou graça diante de Deus, para todos em geral e para cada um em particular, fosse obstáculo a uma alma para encontrar a grande graça da união com Deus?
- Seria possível que Maria pudesse impedir uma alma de se unir perfeitamente a Deus, visto que Ela foi cheia e superabundou em graças, e que viveu tão unida e transformada em Deus que Ele teve de se encarnar n'Ela?
- É bem verdade que a visão de outras criaturas, embora santas, poderia talvez retardar a união divina em certas circunstâncias, mas jamais Maria, como já disse e não me cansarei de repetir.
- Uma das razões porque tão poucas almas atingem a plenitude da idade de Jesus Cristo é que Maria, que é, hoje como sempre, a Mãe do Filho e a Esposa fecunda do Espírito Santo, não está suficientemente formada nos corações.
- Quem deseja possuir o fruto bem maduro e formado deve ter a árvore que o produz. Quem deseja o fruto de vida, Jesus Cristo, deve ter a árvore de vida, que é Maria. 
- Quem quer ter em si a ação do Espírito Santo, deve ter a sua fiel e indissolúvel Esposa, Maria Santíssima, que o torna fértil e fecundo, como já dissemos noutro lugar (nn. 20-21).

§165. Estejamos, portanto, certos de que quanto mais presente tivermos Maria nas nossas orações, contemplações, ações e sofrimentos -se não puder ser de um modo distinto e perceptível, que seja pelo menos de uma maneira geral e implícita-, tanto mais perfeitamente encontraremos Jesus Cristo.
- Ele está sempre em Maria, grande, poderoso, operante e incompreensível, mais que no Céu ou em qualquer outra criatura do universo. Assim, Maria Santíssima, toda mergulhada em Deus, está bem longe de se tornar um obstáculo para os perfeitos chegarem à união com Deus.
- Aliás, é todo o contrário:
  • não houve até hoje nem jamais haverá criatura alguma que nos ajude mais eficazmente nesta grande obra, seja pelas graças que para este efeito nos comunica - pois como diz um santo, “ninguém é cheio do pensamento de Deus senão por Ti” -, seja por garantir-nos contra o espírito maligno em suas ilusões e trapaças.

§166. Lá onde está Maria, não pode estar o espírito maligno.
- Um dos sinais infalíveis de que uma alma é conduzida pelo bom espírito é que possua uma grande Devoção a Maria, e que pense e fale n'Ela
- É esta a opinião dum santo, que acrescenta que assim como a respiração é um sinal certo de que o corpo não está morto, assim o pensamento frequente e a amorosa invocação de Maria é a prova de que a alma não está morta pelo pecado.

167. Diz a Igreja, e o Espírito Santo que a conduz, que “só Maria esmagou todas as heresias deste mundo”. Por isso um fiel devoto de Maria nunca cairá na heresia ou na ilusão, pelo menos formalmente, por mais que os críticos resmunguem. 
- Poderá sim errar materialmente, tomar por verdade uma mentira e por bom o espírito maligno, ainda que mais dificilmente que qualquer outra pessoa. Mas, mais cedo ou mais tarde, conhecerá a sua falta e o seu erro material, e quando o conhecer não se obstinará de forma alguma em crer ou sustentar o que tinha julgado verdadeiro.

É um caminho traçado por Jesus
§168. Portanto, todo aquele que, sem temor de ilusão, comum às pessoas de oração, quiser avançar no caminho da perfeição e encontrar com segurança e perfeitamente Jesus Cristo, abrace de coração dilatado (2 Mac 1, 3) esta Devoção à Santíssima Virgem, que talvez ainda não conheça. 
- Que entre neste excelente caminho que não conhecia e que lhe indico (1 Cor 12, 31), pois é o caminho aberto por Jesus Cristo, a Sabedoria Encarnada, nosso único Chefe, e os membros que o trilharem não podem enganar-se.
  •  É um caminho fácil, devido à plenitude de graça e de unção do Espírito Santo que o enche. Quem por ele caminha não se cansa nem recua.
  • É um caminho curto, que em pouco tempo nos leva a Jesus Cristo.
  • É um caminho perfeito, onde não há lama nem poeira, nem a menor impureza de pecado.
  • É um caminho seguro, que nos conduz a Jesus Cristo e à Vida Eterna, reta e seguramente, sem desvios nem para a direita nem para a esquerda.
- Entremos neste caminho, e avancemos por ele, noite e dia, até a plenitude da idade de Jesus Cristo.
Tratado da Verdadeira Devoção a Santíssima Virgem Maria

São Luis Maria Grignion de Monfort

Maria, caminho fácil, curto e perfeito.

Esta Devoção conduz à união com Nosso Senhor
§152. Quinto motivo. Esta Devoção é um caminho fácil, curto, perfeito e seguro para chegar à união com Deus, na qual consiste a perfeição cristã.

Caminho Fácil
- É um caminho fácil que Jesus Cristo abriu ao vir até nós, e onde não se encontra obstáculo algum para chegar até Ele. Pode-se, na verdade, chegar à união divina por outros caminhos, mas será por muito mais cruzes e mortes misteriosas, com muito mais dificuldades, que só a custo serão vencidas. 
- Será preciso passar por noites escuras, por combates e agonias misteriosas, por cima de montanhas escarpadas, por cima de espinhos muito agudos e por desertos horríveis.
- Mas pelo caminho de Maria passa-se mais suave e tranquilamente. 
- Também aqui se encontram, é certo, rudes combates a travar e grandes dificuldades a vencer. 
- Mas esta boa Mãe e Senhora torna-se tão presente e tão próxima dos Seus fiéis servos para os iluminar nas suas trevas, esclarecer nas suas dúvidas, confirmar no meio dos seus temores, sustentar nas lutas e dificuldades, que este caminho virginal para encontrar Jesus Cristo é realmente um caminho de rosas e mel à vista dos outros. 
- Houve alguns santos, mas em pequeno número, como S. Efrém, S. João Damasceno, S. Bernardo, S. Bernardino, S. Boaventura, S. Francisco de Sales etc., que passaram por este caminho ameno para ir a Jesus Cristo. O Espírito Santo, Esposo fiel de Maria, tinha-lho indicado por uma graça singular. 
- Os outros santos, porém, que são em maior número, embora todos tenham sido devotos da Santíssima Virgem, não entraram, ou entraram muito pouco, nesta via. Foi por isso que sofreram provas mais rudes e perigosas.

§153. Mas então donde vem, dir-me-á algum fiel servo de Maria, que os servos fiéis desta boa Mãe têm tantas ocasiões de sofrer, e mais até do que outros que d'Ela não são tão devotos?
- Contradizem-nos, perseguem-nos, caluniam-nos, não os suportam; ou, ainda, caminham em trevas interiores e por desertos onde não há a mínima gota do orvalho celeste. Se esta Devoção à Santíssima Virgem torna mais fácil o caminho que conduz a Jesus Cristo, donde vem que sejam eles os mais crucificados?

§154. Respondo-lhes: É bem verdade que os mais fiéis servos da Santíssima Virgem são os Seus maiores favoritos. Por isso são eles que recebem d'Ela as maiores graças e favores do Céu, a saber, as cruzes. 
- Mas sustento que são também os servos de Maria que levam essas cruzes com mais facilidade, com maior mérito e glória. Aquilo que deteria mil vezes outras almas, ou as faria cair, não os detém nem uma só vez e faze-os avançar. É que esta Mãe, toda cheia de graça e de unção do Espírito Santo, adoça todas estas cruzes que lhes prepara, no mel da sua Doçura Materna e na unção do Puro Amor. 
- Deste modo eles recebem-nas alegremente como nozes cobertas de açúcar, ainda que em si sejam muito amargas. Uma pessoa que deseja ser devota e viver piedosamente em Jesus Cristo, consequentemente há de sofrer perseguição e levar todos os dias a sua Cruz (Lc 9, 23). Julgo que tal pessoa nunca levará grandes cruzes ou não as levará alegremente, nem até o fim, sem possuir uma terna devoção à Santíssima Virgem, que é a doçura das cruzes. 
- Do mesmo modo ninguém poderá comer, sem se fazer grande violência, que não será muito duradoura, nozes verdes que não sejam adoçadas em açúcar.

Caminho Curto
§155. Esta Devoção à Santíssima Virgem é um caminho curto para encontrar Jesus Cristo, quer porque ninguém se perde nele, quer porque, como acabo de dizer, se avança por ele com mais alegria e facilidade e, portanto, com mais prontidão. 
- Avança-se mais, em pouco tempo de submissão e dependência para com Maria, que durante anos inteiros de vontade própria e de apoio em si mesmo. 
- Pois o homem obediente e submisso a Maria Santíssima cantará vitórias notáveis sobre todos os seus inimigos (Pr 21, 28). 
- Quererão estes impedi-lo de caminhar, fazê-lo recuar ou cair, é verdade. Mas, com o apoio, a ajuda e a guia de Maria, sem cair, sem recuar e mesmo sem se atrasar, avançará a passos de gigante para Jesus Cristo, pelo mesmo caminho por onde, como está escrito, Jesus veio até nós a passos de gigante e em pouco tempo (Sl 18, 6).

§156. Por que julgais que Jesus Cristo viveu tão pouco tempo na Terra e que, nos poucos anos que nela passou, viveu quase sempre em submissão e obediência à sua Mãe? Ah! É que, tendo morrido cedo, viveu muito (Sb 4, 13) e muito mais que Adão, cujas perdas vinha reparar, embora este vivesse mais de novecentos anos. E Jesus Cristo viveu muito porque viveu bem unido e submisso à sua Santa Mãe, para obedecer a Deus seu Pai.
- E é assim pelas seguintes razões:
1ª. Aquele que honra sua mãe é semelhante ao homem que ajunta tesouros, como diz o Espírito Santo. Isto é, aquele que honra Maria, sua Mãe, até se submeter a Ela, a obedecer-lhe em todas as coisas, tornar-se-á em breve muito rico, pois amontoa diariamente tesouros, por esta pedra filosofal:
“Como quem acumula tesouros, assim é aquele que honra sua mãe” (Eclo 3, 5).
2ª. É no seio de Maria, que encerrou e gerou um homem perfeito e que pôde conter Aquele que nem o universo inteiro pode compreender nem conter, é no seio de Maria, digo, que os jovens se tornam velhos anciãos em luz, em santidade, em experiência e em sabedoria, e que atingem em poucos anos a plenitude da idade de Jesus Cristo. Isto baseia-se numa interpretação espiritual da seguinte palavra do Espírito Santo:
“A minha velhice está na misericórdia do seio” (Sl 91, 11).

Caminho Perfeito
§157. Esta prática de Devoção à Santíssima Virgem é um caminho perfeito para ir e para se unir a Jesus Cristo, porque Maria Santíssima é a mais perfeita e a mais Santa das puras criaturas, e Jesus Cristo, que veio a nós de maneira perfeita, não escolheu outro caminho para a sua grande e admirável viagem.
- O Altíssimo, o Incompreensível, o Inacessível, Aquele que é, quis vir a nós, pequeninos vermes da Terra, que nada somos. E como se fez isto?
- O Altíssimo desceu perfeita e divinamente até nós por meio da humildade de Maria, sem nada perder da sua divindade e santidade. É igualmente por Maria que os pequeninos devem subir, perfeita e divinamente, ao Altíssimo, sem nada temer.
- O Incompreensível deixou-se compreender e conter perfeitamente pela humilde Maria, sem nada perder da sua imensidade. É por Maria que nos devemos deixar conter e conduzir perfeitamente, sem nenhuma reserva.
- O Inacessível aproximou-se, uniu-se estreitamente e até pessoalmente à nossa humanidade por intermédio de Maria, sem nada perder da sua majestade. É por Maria que nos devemos aproximar de Deus e unir-nos à Divina Majestade perfeita e estreitamente, sem receio de sermos repelidos.
- Enfim, Aquele que é quis vir ao que não é, e fazer que o que não é se transforme em Deus ou naquele que é. Deus fê-lo perfeitamente, dando-se e submetendo-se inteiramente à jovem Virgem Maria, sem deixar de ser, no tempo, Aquele que é desde toda a eternidade. 
- É ainda por Maria que nos podemos tornar semelhantes a Deus pela graça e pela glória, embora nada sejamos. Basta entregarmo-nos a Ela tão perfeita e inteiramente que já nada sejamos em nós mesmos, mas tudo n'Ela, sem receio de nos enganarmos.

§158. Abram-me um caminho novo para ir a Jesus Cristo, calcetado com todos os méritos dos bem-aventurados, ornado com todas as suas virtudes heróicas, iluminado e enfeitado com a luz e a beleza de todos os anjos, e que os anjos todos e os santos nele se encontrem para conduzir, defender e sustentar aqueles e aquelas que por ele queiram seguir. 
- Com certeza absoluta, digo-o ousadamente, e digo a verdade: eu escolheria, de preferência a este caminho tão perfeito, o caminho imaculado de Maria (Sl 17, 33), caminho sem nódoa alguma nem defeito, sem pecado original nem atual, sem sombras nem trevas. E quando o meu amável Jesus vier segunda vez à Terra, em sua glória, (como é certo), para aqui reinar, não escolherá outro caminho para a sua vinda, senão Maria Santíssima, por quem veio tão segura e perfeitamente primeira vez. 
- A diferença que há entre a primeira e a última vinda é que a primeira foi secreta e escondida, e a segunda será gloriosa e triunfante; mas são ambas perfeitas, pois ambas por intermédio de Maria. Ai! Eis um mistério que não se compreende:
“Que toda a língua aqui emudeça!”
Tratado da Verdadeira Devoção a Santíssima Virgem Maria / São Luis Maria Grignion de Monfort

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Maria, 3º e 4º Motivos da Devoção

Maria se dá ao seu escravo de amor
§144. Terceiro motivo. A Santíssima Virgem, que é uma Mãe toda doçura e misericórdia, nunca se deixa vencer em amor e liberdade.
- Por isso, quando vê que alguém se lhe dá totalmente para a honrar e servir, despojando-se do que tem de mais querido para a amar, dá-se também, inteiramente e duma maneira inefável, a quem tudo lhe deu.
Ela submerge-o no abismo das suas graças,
Ela adorna-o com os Seus méritos,
Ela lhe dá o apoio do seu poder,
Ela o ilumina com a sua luz,
Ela o abrasa no seu amor,
Ela comunica-lhe as suas virtudes: sua humildade, sua fé, sua pureza, etc.
Ela se torna a sua garantia, seu suplemento e seu tudo perante Jesus. - Enfim, como a alma que se consagrou é toda de Maria, também Maria é toda dela.
- Desta maneira pode dizer-se deste fiel servo e filho de Maria o que São João Evangelista diz de si mesmo, isto é, que ele recebeu a Virgem Santíssima como todo o seu tesouro:
“O discípulo a recebeu em sua casa” (Jo 19, 27).

§145. Isto produz na alma, se for fiel, uma grande desconfiança, desprezo e ódio de si mesma, e uma grande confiança e grande abandono à Santíssima Virgem, sua amável Soberana.
- Já não se firma, como antes, nas suas disposições, intenções, méritos, virtudes e boas obras. Porque, tendo feito um sacrifício completo a Jesus por intermédio desta boa Mãe, já não tem senão um só tesouro que encerra todos os seus bens e que já não está em suas mãos, e este tesouro é Maria.
- Isso é que faz que a alma se aproxime de Nosso Senhor sem escrúpulo nem temor servil, e que ela o invoque com muita confiança. Os seus sentimentos tornam-se semelhantes aos do piedoso e sábio Padre Pupert.
- Este, fazendo alusão à vitória de Jacó sobre o Anjo (Gn 32, 23-33), dirige à Santíssima Virgem estas palavras:
“Ó Maria, minha Princesa e Mãe imaculada de Deus feito homem, Jesus Cristo, eu desejo lutar com este Homem, ou seja, com o Verbo Divino, armado não com os meus próprios méritos, mas com os Vossos”.
- Oh! Quão poderoso e forte junto de Jesus Cristo é quem está armado dos méritos e da intercessões da digna Mãe de Deus, que vence amorosamente o Todo-Poderoso, como diz Santo Agostinho!
Maria purifica as nossas boas obras
§146. Como nesta Devoção entregamos a Nosso Senhor, pelas mãos de sua Santa Mãe, todas as nossas boas obras, esta amável Senhora purifica-as, embeleza-as e fá-las aceitáveis para o seu Filho.
1º. Ela os purifica de toda a sujeira do amor próprio e do apego imperceptível à criatura, que estão insensivelmente nas melhores ações.
- E como as mãos da Santíssima Virgem, nunca manchadas nem ociosas, purificam tudo aquilo em que tocam, estas mãos tão puras e fecundas tiram do presente que lhe fazemos tudo o que tiver de estragado ou de imperfeito.

§147. 2º. Ela as embeleza e adorna com Seus méritos e virtudes.
- É como se um camponês, querendo ganhar a amizade e benevolência do rei, fosse ter com a rainha e lhe entregasse uma maçã, que constituísse toda a sua fortuna, a fim de que ela a apresentasse ao rei.
- A rainha, depois de recebida a pobre e pequena oferta do camponês, poria essa maçã numa grande e bela bandeja de ouro oferecendo-a assim ao rei, em nome do camponês. E desde então a maçã - por si mesma indigna de ser apresentada a um rei -, torna-se digna de sua majestade, em atenção à bandeja de ouro e à pessoa que a presenteia.

§148. 3º. Ela apresenta essas boas obras a Jesus Cristo, pois nada reserva para si do que lhe dão, como se fosse fim, mas tudo remete fielmente a Jesus.
- O que se lhe dá, dá-se necessariamente a Jesus. Se a louvam e glorificam, Ela louva e glorifica Jesus. Quando a louvam e bendizem, a Santíssima Virgem canta, como outrora ao ser louvada por Santa Isabel:
A minha alma glorifica o Senhor” (Lc 1,46).

§149. 4º. Ela faz que Jesus aceite essas boas obras, por menores e mais pobres que sejam, enquanto presente para este Santo dos santos e Rei dos reis.
- Quando alguém apresenta a Jesus alguma coisa em seu próprio nome e apoiado na sua habilidade e disposição pessoais, Jesus examina o dom, e, frequentemente, rejeita-o, por causa da sujeira que contraiu pelo amor próprio, tal como outrora rejeitou os sacrifícios dos judeus, repletos que eram de vontade própria (Hb 10, 5-7).
- Mas quando se lhe apresenta alguma coisa pelas mãos puras e virginais da sua bem amada Mãe, toca-se-lhe no ponto fraco, se me é lícito empregar esta expressão. Ele já não considera tanto o que se lhe dá, como a sua boa Mãe, que lho apresenta. Não olha tanto para donde lhe vem esse presente, como para Aquela por quem o recebe.
- Assim Maria, que jamais é rejeitada, e é sempre bem acolhida por seu Filho, faz que sua Majestade receba com agrado tudo quanto lhe apresenta, seja grande ou pequeno.
- Basta que Maria a apresente, para que Jesus receba e aceite. 
- Era o grande conselho que São Bernardo dava àqueles que conduzia à perfeição:
Quando quiserdes oferecer alguma coisa a Deus, tende cuidado de a oferecer pelas mãos muito agradáveis e muito dignas de Maria, se não quiserdes ser repelidos”.

§150. Não é isto mesmo o que a própria natureza inspira aos pequenos em relação aos grandes, como já vimos? Por que a graça não nos levaria a fazer o mesmo em relação a Deus, que está infinitamente acima de nós, e diante de quem somos menos que um átomo? Temos, além do mais, uma advogada tão poderosa que nunca é repelida, tão hábil que conhece todos os segredos para ganhar o Coração de Deus, tão boa e caridosa que não repele ninguém, por pequeno ou mau que seja. Mais adiante mostrarei, na história de Rebeca e Jacó, a verdadeira prefigura das verdades que menciono.

Esta Devoção é um meio excelente para procurar a maior glória de Deus
§151. Quarto motivo. Esta Devoção, fielmente praticada, é um meio excelente para fazer com que o valor de todas as nossas boas obras seja utilizado para a maior glória de Deus.
- Quase ninguém age por este fim tão nobre - embora a isso estejamos obrigados -, seja por não saber em que consiste a maior glória de Deus, seja por não a querer. Mas a Santíssima Virgem, a quem cedemos o valor e o mérito das nossas boas obras, sabe perfeitamente onde reside a maior glória de Deus e não faz nada sem ser para esse fim. 
- Por isso um perfeito servo desta Rainha, inteiramente consagrado a Ela da forma que dissemos, pode dizer corajosamente que o valor de todas as suas ações, pensamentos e palavras é empregado para a maior glória de Deus, a não ser que expressamente revogue o seu oferecimento.
- Poderá haver algo mais consolador para uma alma que ama a Deus, com um amor puro e desinteressado, e que estima a glória e os interesses divinos mais do que os seus próprios interesses?!
Tratado da Verdadeira Devoção a Santíssima Virgem Maria / São Luis Maria Grignion de Monfort

Maria, Motivos da Devoção

§135. Primeiro motivo, que nos mostra a excelência desta consagração de si mesmo a Jesus Cristo pelas mãos de Maria.
- Na Terra não se pode conceber ofício mais elevado que o serviço de Deus, e o menor dos servos de Deus é mais rico, mais poderoso e mais nobre que todos os reis e imperadores do mundo, se estes não servem a Deus. Então, quais não serão as riquezas, o poder e a dignidade do fiel e perfeito servo de Deus, que se dedique inteiramente ao seu serviço, sem reservas, tanto quanto possível! Tal é o fiel e amoroso escravo de Jesus por Maria, que entregou-se todo ao serviço deste Rei dos reis pelas mãos da sua Santa Mãe, e nada reservou para si:
todo o ouro da Terra e as belezas do Céu são insuficientes para o pagar.

§136. As outras congregações, associações e confrarias erigidas em honra de Nosso Senhor e de sua Santa Mãe, que fazem grande bem para o Cristianismo, não nos levam a dar tudo sem reserva. Apenas prescrevem aos seus associados a obrigação de certas práticas e ações, mas deixam-lhes livres todos os outros atos e momentos da vida. Mas esta Devoção de que falamos faz-nos dar incondicionalmente a Jesus e a Maria todos os pensamentos, palavras, ações, sofrimentos e instantes da nossa vida: assim, quer velemos, quer durmamos, quer bebamos ou comamos, quer façamos grandes ou pequeninas coisas, poderemos sempre dizer que tudo o que fazemos, embora nisso não pensemos, pertence a Jesus e a Maria em virtude do nosso oferecimento (1 Cor 10, 31), a não ser que o tenhamos expressamente revogado. Que consolação!

§137. Além disso, como já ficou dito, não há nenhuma outra prática que nos liberte mais facilmente dum certo espírito de propriedade que penetra imperceptivelmente nas melhores ações. O nosso bom Jesus concede esta grande graça em recompensa do ato heróico e desinteressado que se fez, àquele que, pelas mãos de sua Mãe, cedeu-lhe todo o valor das boas obras. - Se Ele dá cem por um, mesmo neste mundo (Mt 19,29), àqueles que por seu amor deixam os bens exteriores, temporais, perecedouros, que recompensa não dará àqueles que lhe sacrificarem mesmo seus bens interiores e espirituais?!

§138. Jesus, o nosso grande amigo, deu-se-nos sem reserva, corpo e alma, virtudes, graças e méritos: “Ele ganhou-me todo, dando-se todo a mim”, diz São Bernardo. Não é um dever de justiça e de reconhecimento que lhe demos tudo o que nos for possível dar? Ele foi o primeiro a ser liberal para conosco. Sejamo-lo também para com Ele, e o veremos cada vez ainda mais liberal, durante a nossa vida, na hora da morte e por toda a eternidade:
Ele será generoso para com aqueles que são generosos para com Ele (Sl 17, 26).

Esta Devoção nos faz imitar o exemplo dado por Jesus Cristo e por Deus mesmo, e praticar a humildade
§139. Segundo motivo, que nos mostra ser justo, em si mesmo, e vantajoso para o cristão o consagrar-se inteiramente a Maria Santíssima com esta prática, com o fim de ser consagrado mais perfeitamente a Jesus Cristo.
- Este bom Mestre não recusou encerrar-se no seio da Santíssima Virgem como um cativo e escravo de amor, nem ser-lhe submisso e obedecer-lhe durante trinta anos. E aqui, repito, que o espírito humano se perde, ao refletir seriamente sobre esta maneira de proceder da Sabedoria Encarnada. – Embora o pudesse fazer, não quis dar-se diretamente aos homens, mas fê-lo pela Virgem Santíssima. Não quis vir ao mundo na idade de homem perfeito, independente de outrem, mas antes como uma pobre e pequenina criança, dependente dos cuidados e sustento de sua Mãe. Esta Sabedoria Infinita, que tinha um desejo imenso de glorificar a Deus, seu Pai, e de salvar os homens, não achou meio mais perfeito nem mais rápido para o fazer do que submeter-se à Santíssima Virgem. E era uma submissão em todas as coisas, não somente durante os oito, dez ou quinze primeiros anos da sua vida, como as outras crianças, mas durante trinta anos.
- E deu mais glória a seu Pai durante esse tempo de sujeição e dependência da Virgem Santíssima, do que lhe teria dado empregando esses trinta anos a fazer prodígios, a pregar por toda a Terra, a converter todos os homens, do contrário, Ele o teria feito. Oh! Como glorifica altamente a Deus quem se submete a Maria, seguindo o exemplo de Jesus!
- Tendo diante dos olhos um exemplo tão visível e conhecido de todos, seremos tão insensatos para julgar possível encontrar um meio mais perfeito e mais direto de glorificar a Deus, do que a sua submissão a Maria, a exemplo de seu Divino Filho?

§140. Recorde-se aqui, como prova da dependência que devemos ter para com a Mãe de Deus, o que acima disse, apontando os exemplos que o Pai, o Filho e o Espírito Santo nos dão da sujeição que devemos à S. Virgem.
- O Pai não deu nem dá seu Filho senão por Ela, não suscita novos filhos senão por Ela, e não comunica as suas graças senão por Ela.
- Deus Filho não foi formado para todos em geral senão por Ela; não é formado e gerado todos os dias (nas almas), em união com o Espírito Santo, e não comunica os Seus méritos e virtudes, a não ser por Ela.
- O Espírito Santo não formou Jesus Cristo senão por meio d'Ela, e não forma os membros do seu Corpo Místico, a não ser por Ela; não dispensa os Seus dons e favores senão por Ela.
- Poderemos, sem uma extrema cegueira, depois de tantos e tão insistentes
exemplos da Santíssima Trindade, passar sem Maria, não nos consagrar a Ela e nem depender d'Ela para irmos a Deus e nos sacrificarmos a Deus?

§141. Eis algumas passagens dos Padres, que escolhi para provar o que acabo de dizer:
“Maria tem dois filhos, um Homem-Deus e o outro homem puro. Do primeiro é Mãe corporalmente e do segundo espiritualmente” (São Boaventura e Orígenes).
“Esta é a vontade de Deus, que quis recebêssemos tudo por Maria.
Se, pois, temos alguma esperança, alguma graça, algum dom salutar, saibamos que nos vem d'Ela”. “Porque eras indigno de receber as graças divinas, elas foram dadas a Maria, a fim de que recebas por Ela tudo o que venhas a possuir” (São Bernardo).
“Todos os dons, virtudes e graças do Espírito Santo são distribuídos pelas mãos de Maria, a quem Ela quer, quando, como e na medida que Ela quer” (São Bernardino).

§142. Deus - como diz São Bernardo - vendo que somos indignos de receber as graças diretamente das suas mãos, dá-as a Maria, a fim de que por Ela recebamos tudo o que Ele nos quis dar. E Deus encontra também a sua glória em receber, pelas mãos de Maria, o reconhecimento, o respeito e o amor que lhe devemos pelos Seus benefícios. É, pois, muito justo, que imitemos o procedimento de Deus, “para que a graça regresse ao seu Autor pelo mesmo canal por onde veio”, segundo o mesmo São Bernardo.
- É precisamente o que fazemos por esta Devoção: oferecemos e consagramos tudo o que somos e tudo o que possuímos à Santíssima Virgem, para que Nosso Senhor receba por seu intermédio a glória e o reconhecimento que lhe devemos.
- Reconhecemo-nos indignos e incapazes de nos abeirarmos da sua Majestade infinita só por nós mesmos, e por isso servimo-nos da intercessão da Santíssima Virgem.

§143. Além disso, trata-se aqui de um ato de profunda humildade, virtude que Deus ama acima de todas as outras. Uma alma que se eleva, rebaixa a Deus; uma alma que se humilha, eleva a Deus (Jo 3, 30). Deus resiste aos soberbos e dá a sua graça aos humildes (Tg 4, 6). Se nos humilharmos, julgando-nos indignos de comparecer perante Deus e de nos aproximar d’Ele, Deus desce, abaixa-se para vir a nós, para se comprazer em nós e nos elevar, apesar da nossa miséria. Mas, pelo contrário, quando alguém se aproxima ousadamente de Deus, sem querer medianeiros, Deus esquiva-se, e não podemos chegar até Ele. Oh! Como Ele ama a humildade de coração! - É a tal humildade que leva a prática desta Devoção, pois ensina a nunca nos aproximarmos de Nosso Senhor por nós mesmos, por mais doce e misericordioso que Ele seja, mas a servir-nos sempre da intercessão de Maria, para comparecer diante de Deus, seja para lhe falar, seja para simplesmente estreitar a proximidade, seja para lhe oferecer alguma coisa, seja para unir-nos e consagrar-nos a Ele.
Tratado da Verdadeira Devoção a Santíssima Virgem Maria / São Luis Maria Grignion de Monfort

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Renovação dos Votos do Batismo

Uma Perfeita Renovação dos Votos do Santo Batismo
§126. Como disse, esta Devoção podia muito justamente chamar-se uma renovação perfeita dos votos ou promessas do Santo Batismo.
- Todo cristão, antes do Batismo, era escravo do demônio, pois lhe pertencia.
- Ao receber este sacramento renunciou solenemente, pela própria boca ou pelas de seu padrinho e sua madrinha, a satanás, às suas pompas e às suas obras. Assim tomou a Jesus Cristo por seu Mestre e Soberano Senhor, a fim de depender d'Ele na qualidade de escravo de amor. É o que se faz pela presente Devoção:
  • renuncia-se (como está expresso na fórmula da consagração), ao demônio, ao mundo, ao pecado e a si mesmo, dando-se inteiramente a Jesus Cristo pelas mãos de Maria. E ainda se faz mais, porque no Batismo fala-se habitualmente pela boca de outra pessoa, isto é, do padrinho e da madrinha. A entrega a Jesus Cristo é feita por intermediários. Mas nesta Devoção damo-nos por nós mesmos, voluntariamente, com conhecimento de causa.
- No Batismo não nos damos a Jesus Cristo pelas mãos de Maria, ao menos de maneira expressa, e não damos a Jesus Cristo o valor das nossas boas obras. Ficamos, depois de recebido o sacramento, com plena liberdade de aplicar aquele valor a quem quisermos ou de o reservarmos para nós. Por esta Devoção, porém, damo-nos expressamente a Nosso Senhor pelas mãos de Maria, e consagramos-lhe o valor de todas as nossas ações.

§127. Diz Santo Tomás: “Os homens fazem no Batismo voto de renunciar ao demônio e às suas pompas”. E, segundo Santo Agostinho, é este o maior e mais indispensável dos votos, em que prometemos permanecer em Cristo. O mesmo dizem os canonistas:
“O principal voto é aquele que fazemos no Batismo”.
- No entanto, quem é que guarda este grande voto? 
- Quem cumpre fielmente as promessas do Santo Batismo? 
- Não é verdade que quase todos os cristãos quebram a fidelidade prometida a Jesus Cristo no seu Batismo? 
- Donde provirá este desregramento universal, senão do esquecimento em que se vive das promessas e compromissos do Batismo, e do fato de que quase ninguém ratifica por si mesmo o contrato de aliança que fez com Deus por meio de seus padrinhos!

§128. Isto é muito verdade. O Concílio de Sens foi convocado por ordem de Luís, o Bondoso, para remediar as grandes desordens dos cristãos. Ora, este concílio entendeu que a principal causa dessa corrupção de costumes provinha do esquecimento e da ignorância em que se vivia das promessas do Batismo. E não encontrou melhor meio para remediar tão grande mal que o de levar os cristãos a renovar os votos e promessas do Santo Batismo.

§129. O Catecismo do Concílio de Trento, fiel intérprete das intenções deste santo concílio, exorta os párocos a fazer o mesmo:
“Levem os seus fiéis a recordar e crer que estão ligados e consagrados a Nosso Senhor Jesus Cristo como escravos ao seu Redentor e Senhor”.

§130. Ora, os concílios, os Padres da Igreja e até a experiência mostram-nos que o melhor meio para remediar os desregramentos dos cristãos é lembrar-lhes as obrigações do seu Batismo e fazer-lhes renovar os votos que nele emitiram.
- Portanto, não é bastante razoável que o façamos agora duma maneira perfeita, mediante esta Devoção e consagração a Nosso Senhor por meio de sua Mãe Santíssima? Digo duma maneira perfeita porque, ao consagrarmo-nos a Jesus Cristo, nos servimos do mais perfeito de todos os meios, que é a Santíssima Virgem.

Respondendo a algumas objeções
§131. Não se pode objetar que esta Devoção seja nova ou indiferente.
- Não é nova, pois os concílios, os Padres e vários outros autores, antigos e modernos, falam desta Devoção a Nossa Senhora, ou renovação dos votos do Batismo, como de coisa praticada antigamente, e que aconselham a todos os cristãos.
- Não é indiferente ou sem importância, porque a principal fonte de todas as desordens, e logo, da condenação dos cristãos, vem do esquecimento e do abandono desta prática.

§132. Poderá alguém dizer que esta Devoção, fazendo-nos dar a Nosso Senhor, pelas mãos da Santíssima Virgem, o valor de todas as nossas boas obras, orações, mortificações e esmolas, nos impossibilita de socorrer as almas de nossos parentes, amigos e benfeitores.

- Em primeiro lugar, respondo que não é de crer que os nossos amigos, parentes ou benfeitores sejam prejudicados pelo fato de nos termos dedicado e consagrado sem reservas ao serviço de Nosso Senhor e da sua Santa Mãe. Pensá-lo seria fazer uma injúria ao poder e à bondade de Jesus e Maria, que saberão muito bem socorrer os nossos parentes, amigos e benfeitores com o nosso pequeno tesouro espiritual, ou por outros meios.

- Em segundo lugar, esta prática não impede que se reze pelos outros, quer sejam vivos ou mortos, embora a aplicação das nossas boas obras dependa da vontade da Santíssima Virgem.
- Mas, pelo contrário, levar-nos-á a orar com mais confiança, precisamente como uma pessoa rica que tivesse entregado toda a sua fortuna a um grande príncipe, para o honrar melhor, suplicaria com mais confiança a este príncipe que desse esmola a algum dos seus amigos que lha pedisse.
- Daria até prazer ao príncipe por proporcionar-lhe assim ocasião de mostrar seu reconhecimento para com uma pessoa que se despojou para o revestir, e que se fez pobre para o honrar.
- O mesmo se deve dizer de Nosso Senhor e da Santíssima Virgem: nunca se deixarão vencer em gratidão.

§133. Dirá talvez outro, se dou à Santíssima Virgem todo o valor das minhas ações para que o aplique a quem quiser, será talvez preciso que sofra muito tempo no Purgatório.
- Esta objeção, que nasce do amor próprio e da ignorância acerca da liberalidade de Deus e da Virgem destrói-se por si mesma.
- Uma alma fervorosa e generosa, que preza mais os interesses de Deus que os seus; que dá a Deus, sem reservas, tudo o que tem, sem poder dar mais; que só anseia pela glória e pelo Reino de Jesus por Maria; que se sacrifica inteiramente para o conseguir; essa alma generosa e liberal haverá de ser castigada no outro mundo por ter sido mais liberal e mais desinteressada do que as outras?
- De modo algum: é para com essa alma, como veremos mais adiante, que Nosso Senhor e sua Santa Mãe são mais liberais neste mundo e no outro na ordem da natureza, da graça e da glória.

§134. É necessário vermos agora, o mais brevemente possível, os motivos que nos devem tornar recomendável esta Devoção, os maravilhosos efeitos que produz nas almas fiéis, e as suas práticas.
Tratado da Verdadeira Devoção a Santíssima Virgem Maria / São Luis Maria Grignion de Monfort